sábado, 6 de julho de 2019

Lectio Vicentina: Maria



Maria na experiência espiritual de São Vicente de Paulo

Vicente de Paulo fixa sua atenção sobre três ícones, três mistérios que envolvem a vida de Maria e explicitam sua missão: a Imaculada Conceição, a Anunciação e a Visitação. A espiritualidade mariana de Vicente de Paulo situa-se no núcleo de sua experiência espiritual: dar-se a Deus para servir aos Pobres.

1.       A Imaculada Conceição
São Vicente vê, no mistério da Imaculada Conceição, a Virgem humilde e casta, vazia de si mesma para acolher a Deus e deixar-se plenificar por ele. Atitudes fundamentais para os que querem esvaziar-se de si mesmo e revestir-se do espírito de Cristo: “Previu Deus, pois, que, como era preciso que seu Filho tomasse carne humana de uma mulher, era conveniente que a tomasse de uma mulher digna de recebê-lo, uma mulher que estivesse cheia de graça, vazia de pecado, enriquecida de piedade e preservada de todos os maus afetos. Apresentou, então, diante de seus olhos todas as mulheres que havia no mundo e não encontrou nenhuma tão digna desta grande obra como a puríssima e imaculada Virgem Maria. Por isso, se propôs, desde toda a eternidade, preparar esta morada, adorná-la com os mais admiráveis e dignos bens que pode receber uma criatura, a fim de que fosse um templo digno da divindade, um palácio digno de seu Filho. Se a previsão eterna pôs, desde então, seus olhos para descobrir este receptáculo do seu Filho e, depois de descobri-lo, adornou-o com todas as graças que podem embelezar uma criatura, como ele mesmo declarou pela boca do anjo que lhe enviou como embaixador, com maior razão haveremos de prever o dia e a disposição requerida para receber-lhe!” (SV XIII, 35).

Acolher a Deus, encher-nos de Deus, revestir-nos de Jesus Cristo, vazios de nós mesmo, como a Imaculada, tal é o primeiro desafio que Vicente de Paulo nos propõe, à luz do exemplo da Virgem Maria. 

2.       A Anunciação
A humildade prepara e sustenta a oferta de si a Deus. Conhecer Deus e reconhecê-lo como único Senhor, saber-se pequeno diante dele, dar-se a ele para servir ao próximo, para realizar a sua obra, é o segundo movimento que Vicente descobre em Maria, a partir do ícone da Anunciação: “É preciso reconhecer a essência e a existência de Deus e ter algum conhecimento de suas perfeições antes de oferecer-lhe um sacrifício. Isso é natural, pois a quem ofereceis vossos presentes? Aos grandes, aos príncipes e aos reis. A esses é que rendeis vossa homenagem. Tão certo é isso que Deus observou esta mesma ordem na encarnação. Quando o anjo foi saudar a Virgem Maria, começou por reconhecer que estava cheia das graças do céu: Ave, gratia plena. Senhora, estás cheia e cumulada dos favores de Deus; Ave, gratia plena. Assim a reconhece e louva-a como cheia de graça. E o que faz em seguida? Aquele lindo presente da segunda pessoa da Santíssima Trindade. O Espírito Santo, reunindo o sangue mais puro da Santíssima Virgem, formou com ele um corpo; depois, Deus criou uma alma para informar aquele corpo e, em seguida, o Verbo se uniu àquela alma e àquele corpo por uma união admirável e, desta forma, o Espírito Santo realizou o mistério inefável da encarnação. O louvor precedeu o sacrifício” (SV XII, 226-227).

Como Maria na Anunciação, somos chamados a dar-nos inteiramente a Deus para realizar a sua obra: “Assim, pois, diz-se que é necessário buscar o Reino de Deus. Isso não é mais do que uma palavra, mas parece-me que diz muitas coisas. Quer dizer que temos de trabalhar de tal modo que aspiremos sempre ao que se nos recomenda, que trabalhemos incessantemente pelo Reino de Deus, sem ficarmos numa situação cômoda e parados (...). Buscai, buscai, isto quer dizer preocupação, isto quer dizer ação” (SV XI,131). A adesão de Maria à iniciativa de Deus serve-nos de estímulo na fidelidade ao dom da vocação.
           
3.       A Visitação
Vazios de nós mesmos e entregues a Deus, nossa vida está a serviço dos pobres: “vós vos destes a Deus para o serviço dos pobres”, recordava, com insistência, nosso fundador. São Vicente descobre na Visitação de Maria a Isabel este terceiro movimento do caminho espiritual e propõe a prontidão e a solicitude de Maria na Visitação como modelo para o serviço dos pobres: “Honrarão a visita da Santíssima Virgem quando foi visitar sua prima com prontidão e alegria” (SV XIII, 419). E assim deduzirá as aplicações concretas para a vida da Filha da Caridade: “A Companhia das Filhas da Caridade foi fundada para amar a Deus, servi-lo e honrar Nosso Senhor, seu amo, e à Santíssima Virgem. E como o honrareis? Vossa Regra vos indica, fazendo-as reconhecer o plano de Deus em vossa fundação: para servir aos pobres enfermos, corporalmente, administrando-lhes tudo o que lhes é necessário; e espiritualmente, procurando que vivam e morram em bom estado” (SV IX, 20).

Em toda e qualquer circunstância, São Vicente sempre nos conduz aos pobres. Como Maria, nossa vida é doação total a Deus para o cuidado e a promoção dos irmãos mais pobres.


INSPIRAÇÃO BÍBLICA: Lc 1,26-38 (Anunciação)
   Lc 1,39-56 (Visitação)


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