Exortação
a um irmão moribundo 1645[1]
Sim, meu caríssimo irmão, é
verdade, e não há por que duvidar, que sempre aprouve a Deus o fato de que vós
o amais, mas especialmente nesta hora. A fim de que o amássemos, ele nos fez à sua
imagem e semelhança, visto que não se ama, a não ser a quem lhe é semelhante,
senão em tudo, ao menos em algo. Esse grande Deus, ao criar-nos com o plano de
exigir de nós essa agradável ocupação de amá-lo e esse honroso tributo, quis
colocar em nós o germe do amor, que é a semelhança, a fim de que não nos
escusássemos, dizendo que não poderíamos retribuir-lhe jamais. Esse enamorado
de nossos corações, ao ver que, por desgraça, o pecado havia deteriorado e
manchado essa semelhança, quis romper todas as leis da natureza para reparar
esse dano, mas com a vantagem maravilhosa de que não se contentou em
devolver-nos a semelhança e a marca da sua divindade, mas quis, com o mesmo
propósito de que o amássemos, fazer-se semelhante a nós e revestir-se de nossa
própria humanidade. E quem vai querer, então, eximir-se de tão justa e salutar
obrigação?
Ademais, como o
amor é inventivo até o infinito, depois de haver subido ao patíbulo infame da
cruz, para conquistar as almas e os corações daqueles por quem deseja ser
amado, para não falar de outros inumeráveis estratagemas que utilizou para esse
fim, durante sua passagem entre nós, prevendo que sua ausência poderia causar
alguma dúvida ou esfriamento em nossos corações, quis se opor a esse
inconveniente, instituindo o augusto sacramento, onde se encontra real e
substancialmente como está no céu. Além disso, vendo que, rebaixando-se e
aniquilando-se ainda mais do que havia feito na encarnação, poderia fazer-se,
de algum modo, mais semelhante a nós ou, ao menos, fazer-nos mais semelhantes a
ele, fez que esse venerável sacramento nos servisse de alimento e de bebida,
pretendendo, por esse meio, que a mesma união e semelhança que se faz entre a
natureza e a substância se fizesse espiritualmente em cada um dos homens. Porque
o amor pode e quer tudo, ele assim o quis; e por receio de que os homens, não
entendendo bem este inaudito mistério e estratagema de amor, fossem negligentes
em aproximar-se deste sacramento, obrigou-os a ele sob pena de incorrer em sua
desgraça eterna: Nisi manducaveritis
carnem Filii hominis, non habebitis vitam [Quem não comer a carne do Filho do
Homem, não terá a vida] (Jo 6, 54).
Vede como ele se
esforçou, por todos os meios imagináveis, em conseguir que todos os homens o
amassem; e, para isso, deveis excitar vosso coração, para pagar este justo e
suave tributo ao amor de um Deus que foi o objeto de todos os seus desígnios
sobre vós e que, para obtê-lo, fez tudo o que fez por vós. Crede que o maior
presente que podeis oferecer-lhe é o vosso coração, e ele não vos pede nada
mais: Fili, praebe mihi cor tuum [Filho,
dai-me o teu coração (Prov 23, 26)].
Inspiração bíblica: 1Jo 4,
7-16; Sl 145(144).
Para refletir:
1)
Tenho consciência de que,
ao receber o corpo e o sangue de Cristo Jesus, estou comungando de sua vida e
de sua missão?
2)
A Eucaristia, memorial da
Páscoa de Jesus, faz de mim um homem capaz de viver a comunhão com todos, em
especial com os mais pobres?
3)
A minha participação na
Eucaristia leva-me a redescobrir continuamente o amor infinitamente inventivo
do Senhor e a comunicá-lo no cotidiano de minha vida e na minha ação
missionária?
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