Esta
encíclica do Papa Francisco, como também vários outros documentos produzidos
por ele, está intimamente associada ao seu grande projeto pastoral para a
Igreja, escrito no início de seu pontificado: A “Evangelli Gaudium”, ou se desejarem, “A Alegria do Evangelho”. Portanto, uma
vez que nos apropriamos da Evangelli
Gaudium, é perceptível que todos os documentos posteriores a ela,
explicitem e desenvolvam vários temas que já foram nela mencionados, e que, no
pensar do Papa, não podem ficar no esquecimento. Lembramos, por exemplo, dos
seguintes documentos: “Laudato Si”
(Louvado Seja), Sobre o Cuidado da Casa Comum (2015), Conf. EG 215-216; “Amoris Laetitia”, “Sobre o Amor na
Família” (2016), Conf. EG n. 66; “Gaudete
Et Exsultate”, “Sobre a Chamada à Santidade no Mundo Atual” (2018), conf.
EG 119-120; “Fratelli Tutti” (Somos
Todos Irmãos), Sobre a Fraternidade e a Amizade Social (2020), Conf. EG
186-216.
Falando especificamente sobre a “Fratelli
Tutti”, que é o nosso objeto de estudo e reflexão, observamos nas entrelinhas
que o Papa, mais do que nunca, deixa claro nesta encíclica, que o nome que ele
escolheu para o seu pontificado, Francisco, não é simplesmente um ato de
devoção ou admiração pelo Santo italiano, é mais uma tentativa de encarnação
dos sonhos, dos ideais e da coerência com Evangelho que, o Santo italiano, em
seu tempo, procurou viver de maneira profética. Neste sentido, o Papa afirma:
“São Francisco de Assis foi pai fecundo que suscitou o sonho de uma sociedade
fraterna... Naquele mundo cheio de torres de vigia e muralhas defensivas, as
cidades viviam guerras sangrentas entre famílias poderosas, ao mesmo tempo
cresciam as áreas miseráveis das periferias excluídas. Lá Francisco recebeu, no
seu íntimo, a verdadeira paz, libertou-se de todo desejo de domínio sobre os
outros, fez-se um dos menos favorecidos e procurou viver em harmonia com todos”
(FT, 4).
Portanto, à luz do
testemunho de São Francisco de Assis, o Sumo Pontífice diz que foi o santo que
o inspirou a escrever esta encíclica e que nunca ficou tranquilo com as graves
questões sociais. Ele diz: “As questões relacionadas com a fraternidade e
amizade social sempre estiveram entre minhas preocupações. A elas me referi
repetidamente nos últimos anos e em vários lugares. Nesta encíclica, quis
reunir muitas dessas intervenções, situando-as em um contexto mais amplo de
reflexão” (FT, 5).
Olhando de forma
global para encíclica, sem querer direcionar a leitura do documento, mas com o
desejo de aguçar a leitura do expectador, destacamos aqui algumas ideias que
brotaram da leitura, que nos introduz ou nos dá uma pequena ideia do que será
tratado em cada capítulo, vejamos:
Capítulo l – As Sombras de Um Mundo Novo: Entre vários assuntos colocados, o Papa
chama atenção a perda da consciência histórica, a polarização política, a
imposição de um modelo cultural único e a cultura do descartável;
Capítulo ll – Um Estranho no Caminho: O Papa admira o quanto a humanidade
desenvolveu e cresceu em vários aspectos, “mas somos analfabetos em acompanhar,
cuidar e sustentar aos mais frágeis e fracos das nossas sociedades”.
Capítulo lll – Pensar e Criar um Mundo Aberto: Segundo o Papa, o ser humano só consegue seu
desenvolvimento pleno numa entrega sincera ao semelhante. Grupos fechados, que
crescem em torno de si, e se levantam contra a sociedade são formas de egoísmo
idealizado.
Capítulo lV – Um Coração Aberto ao Mundo
Inteiro: Uma reflexão, de modo especial, sobre o problema migratório. Aqui o
Pontífice recorda que os esforços diante dos migrantes se resumem em quatro
verbos: acolher, proteger, promover e integrar. Mas, o ideal é que, todos
encontrem em seus países a possibilidade de viver e crescer com dignidade.
Capítulo V – A Melhor Política: Sem nenhum rodeio, o Papa afirma que
tradicionalmente, a forma que se faz política não inclui, mas exclui os fracos
e desrespeita a diversidade cultural. Falta muito para acontecer a verdadeira
política a serviço do bem comum.
Capítulo Vl – Diálogo e Amizade: Aqui, entre as várias colocações, passa-se a
ideia que, o diálogo necessita ser enriquecido e iluminado por razões, e não
exclui a convicção de que é possível chegar a algumas verdades elementares que
devem e deveriam ser sempre sustentadas.
Capítulo Vll – Caminhos de Reencontros: O Papa nos deixa a evidência que o processo
de paz é um compromisso constante. Para este processo é indispensável a
transparência e a preservação da memória histórica: “a verdade é uma
companheira inseparável da justiça e da misericórdia”.
Capítulo Vlll – As Religiões a Serviço da
Fraternidade: Valorizando o papel singular de cada religião, o Pontífice afirma que
“as distintas religiões a partir da valorização de cada pessoa como filho de
Deus, oferecem uma contribuição valiosa para a construção da fraternidade e
para a defesa da justiça na sociedade.
De forma geral, são
estas ideias que, a princípio, colocamos sobre a encíclica. Ela, sem dúvida, é
um documento muito importante para a atualidade. Certamente, será contada no
rol dos documentos da “Doutrina Social da Igreja”, nos quais os Papas se
mostram atentos sobre as grandes demandas sociais da humanidade e procuram
refletir, questionar e propor alternativas para o bem comum. O Papa Francisco,
ao entregar esta encíclica a Igreja e a humanidade afirma: “Entrego esta encíclica social como humilde contribuição para reflexão,
a fim de que, perante às várias formas atuais de eliminar ou ignorar os outros,
sejamos capazes de reagir com um novo sonho de fraternidade e amizade social
que não se limite a palavras. Embora a tenha escrito a partir das minhas
convicções cristãs, que me animam e nutrem, procurei fazê-lo de tal maneira que
a reflexão se abre ao diálogo com todas as pessoas de boa vontade” (FT,
6).
Acredito que, estas
palavras foram apenas um aperitivo sobre o que virá, no contato mais crítico e
sistemático com cada capítulo da encíclica. Ler, refletir, confrontar as
ideias, tirar conclusões, formar opiniões, trazer o texto para realidade e ter
uma boa iluminação são características fundamentais para todos nós que nos
propomos ser amigos de uma teologia saudável.
Pe. Wander Ferreira, CM
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